segunda-feira, 6 de maio de 2013

Reflexão sobre a batalha#1 – A trajetória exaustiva e o prazer encontrado nela


O sol ainda brilhava, mas aos olhos dos guerreiros já se fazia noite. Os olhos só enxergavam noite. Só se via o oponente, no máximo o campo de batalha. Tantos outros fatos que chamariam a atenção dos poetas e elevariam suas mentes e corações a um mundo inteligível, não passavam, no momento, de um plano de fundo distorcido e desprezado. A algazarra inquietante que acordaria um sonolento era como o zumbido de mosquitos desprezíveis num momento de prazer. Nada tirava as concentrações. Foco. Sacavam-se as espadas e todo o resto escurecia, menos as lâminas que cintilavam o que restava da luz do sol.

Sangue. Rios de sangue jorram dos campos de batalha por motivos fúteis. As disputas por territórios, os pretextos dos reis sedentos e a própria convicção de fé, não inundariam os campos de batalha se a sede de lutar dos guerreiros não fosse maior que as outras desculpas que a guerra usa.
A espada rouba o coração dos homens e sua determinação com mais intensidade que o capricho das princesas. Reverenciam sua majestosa paixão com o mesmo fervor. Submetem-se a sofrimentos, dores, dificuldades. Enfrentam suas próprias contrariedades em virtude delas, as princesas e as batalhas possuem esse mesmo poder.

O fim da batalha não parece ser a paz, mas sim a própria batalha. Como a violência tem o fim na própria violência, embora traga conseqüências pacificadoras ou destrutivas. O objetivo da guerra não é a paz. É a guerra, a dominação. A trégua é que tem a paz por finalidade. Quem almeja a paz, propõe trégua, sofre afronta, recusa-se a ter a razão. Quem defende sua posição e propõe a disputa, almeja a disputa.
Como o corpo reage prazerosamente ao alimento a ao afago, o homem satisfaz-se em dominar, ser notado, e destacar-se. Esses três elementos parecem ser um verdadeiro alimento para o ego. E na fome do ego mora a vontade, o desejo, que se pronuncia muitas vezes, além das necessidades básicas. Daí surge o anseio pela batalha. Que carrega consigo a característica de uma peregrinação, onde se aprende e se desfruta da viagem.
Entenda-se que aqui, neste pensamento, batalha e guerra não consistem num risco corrido em defesa de uma vida ou de uma subsistência (pode ser também no sentido não violento). Mas sim, de uma maneira geral, uma disputa qualquer, seja ela por poder, território, reconhecimento diante de uma classe ou individuo, e até mesmo por vangloria.

Nas contrações musculares, gotas de suor, e energia gasta. De alguma forma que só a vontade pura explica. Encontra-se prazer no esforço físico e mental. O prazer que se encontra numa trajetória exaustiva, só se explica, quando o fim da trajetória é ela mesma. Não é a toa que quem vive pela espada, por ela morre. Quem almeja a batalha deve viver por ela. Quem almeja a ciência deve viver por ela. Da mesma forma quem almeja Deus, deve viver por ele.
O estilo de vida em guerra é uma iniciativa de quem tem prazer na guerra. Do mesmo jeito, quem tem realização na autonegação, privação ou reflexão. Pois se sabe que essas coisas, só alcançam, no fim delas, elas mesmas. Não se transformam nem se destroem, somente se intensificam à medida em que se aprofunda na prática da batalha.

Em linhas gerais, as batalhas não necessárias, são necessárias. Funcionando da mesma forma que os hobbies, que na lógica não fazem sentido, não possuem na sobrevivência, um caráter definido como necessidade. Acabam sendo necessários pelo poder de fazer mergulhar em uma atividade tão intensamente, a ponto de fazer do fim o próprio meio. A realização pura.
Assim, um jovem condicionado a conquistar várias garotas, tendo momentos de prazer com umas e outras, não se satisfaz se for de repente levado a assumir um compromisso sério com somente uma. Deve-se, portanto, entender que a prática constante de uma atividade torna-se o foco desta mesma atividade. Neste caso do exemplo, a prática da fidelidade almeja a fidelidade, e tem por conseqüência o bem da não traição e a virtude. Da mesma forma, o que pratica a arte marcial, submetendo-se a treinamentos intensos, realiza-se em tais treinamentos, e busca na disputa competitiva o próprio condicionamento para a arte, que tem por conseqüência o aperfeiçoamento e o mérito.

O guerreiro luta então, desfrutando da própria luta cada momento. Desfrutando de cada treinamento o próprio sofrimento. Pois no dia em que não houverem dúvidas, espadas que se oponham ou obstáculos que se ponham a frente de algum objetivo traçado. Já não há mais lógica na auto-superação. Resta-nos o descanso e a contemplação da verdade revelada. E tais coisas não exigem prática.


10 de maio de 2012
J. Caetano Jr.

2 comentários:

Fiquem a vontade... Não paga.

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